Ilustração de Jennifer Lambein |
É
preciso falar baixo no sítio da primavera, junto
à
terra nocturna. Junto à terra transfigurada.
Tudo
ouve as minhas palavras talvez irremediáveis.
Infatigável
perfume se acrescenta nos jacintos, fogo
sem
fim circunda suas raízes leves.
É
preciso não acordar do seu ofício a luz que inclina
os
meus espinhos frios,
a
lua que inclina meu sangue ligado e o sangue
da
terra nocturna.
Agora
a primavera trabalha nas galerias mais antigas,
bate
os seus martelos contra um milhão de estrelas.
(...)
Ilustração de Claire Robertson |
A
primavera cresce num núcleo de ideias, as cabras
evaporam-se,
reaparecem em espírito
mastigando
giestas. Primavera é uma palavra
numa
língua demasiado estrangeira.
Uma
coisa enorme, sem música.
Falo
tão devagar que mal distingo
a
noite sobre a terra
da
minha garganta onde os animais passam
lentamente
inspirados.
Só
encosto a testa ao oculto fogo dos nomes,
e
o sangue alimenta a loucura
devagar, devagar — como quem ressuscita.
Ilustração de Erin Hogan |
Herberto Helder, in Ou o poema contínuo