Amor, de Miss Miza |
"Eva sabia que estava a nascer nos olhos dele, mais concretamente nas íris cor de sépia, onde começava a ver a dupla pequena imagem da sua figura e da sua identidade. Eva disse-lhe: "Vamos chegar atrasados. Eu marquei com o construtor estarmos lá por volta do meio-dia. Temos de ir." Ele respondeu: "Mas ainda não acabei de engendrar-te."
"É doce estar espelhada nos olhos do amor. E, risonha como sempre, disse alto: É amor, isto? Vou ser tua? (...)"
"Estou a ver se imprimo a tua face na minha" [disse ele].
Ilustração de Özturk |
"Eva sentia ali, de súbito, numa rua de Lisboa, o seu sangue e o dele, à superfície. Sabia que estava a ser criada no sangue dele, e que esse é um dos movimentos do amor, feito de movimento cada vez mais próximo. Ele gritou: "Está ali um táxi." E correram, como dois corpos que começam a querer ser um só."
"Se assim for", disse Eva, já sentada no táxi, "se somos dois corpos que vão ser um, é a Criação ao contrário."
Excertos do conto "Eva sabia", de Fiama Hasse Pais Brandão,
in Contos da Imagem, Assírio & Alvim