Os momentos de profunda tristeza eram incapazes de o fazer lacrimejar. Havia um qualquer bloqueio emocional que lhe continha o choro. Talvez se chorasse fosse mais feliz, nunca o poderia saber. Estava condenado a carregar as mágoas dentro do peito, sem as poder alijar, chorando. Andar à chuva causava-lhe uma sensação de pranto e de libertação, mitigando-lhe a ausência de lágrimas. Postado à janela, observava o desvelo da chuva, esmagando-se nos passeios e nos portais das casas, num contagiante efeito catártico.
Picasso, La femme qui pleure |
Entrou numa sala onde tinha exposto um quadro de Picasso: La Femme qui Pleure.
Miguel Miranda (2013), in A Paixão de K, Porto Editora, 1ª ed., pp. 42-43