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29 de novembro de 2012

28 de novembro de 2012

Violoncelo


Ilustração de Miharu Yokota



E haverá nos gestos que nos representam

a unidade de uma nota de violoncelo 

E onde quer que estejamos será sempre

um terraço a meia altura


 Ruy Belo, in Todos os Poemas

Juliana Couceiro



Ilustração de Henrique Cayatte


Devia ter quarenta anos, era muitíssimo magra. As feições espremidas tinham a amarelidão de tons baços das doenças de coração. Os olhos grandes, encovados, rolavam numa inquietação, numa curiosidade, raiados de sangue, entre pálpebras sempre debruadas de vermelho. Usava uma cuia de retrós imitando tranças, que lhe fazia a cabeça enorme. Tinha um tique nas asas do nariz.

Eça de Queirós, in O Primo Basílio

Luísa



Ilustração de Henrique Cayatte

Roupão de manhã de fazenda preta, bordado a soutache, com largos botões de madrepérola; o cabelo louro um pouco desmanchado, com um tom seco do calor do travesseiro, enrolava-se, torcido no alto da cabeça pequenina, de perfil bonito; a sua pele tinha a brancura tenra e láctea das louras.

Eça de Queirós, in O Primo Basílio

27 de novembro de 2012

Nadar por correspondência




Ilustração de Monique Passicot


... ler Literatura não obedece aos mesmos esquemas mentais (e culturais) da leitura de um qualquer outro tipo de texto ou obra. Muito menos se se tratar de um jornal ou revista. O verdadeiro acto de ler (literatura) é por excelência um acto pessoal, criativo, vivo. Não é um acto passivo, maquinal, repetitivo…É um mergulho no interior do texto que acaba por nos tocar e inundar a nossa sensibilidade e ideias. A partir daqui, deste mergulho nas palavras e no ritmo das ideias e das situações, temos o prazer de exercitar a nossa imaginação e sensibilidade – que podem ser manifestadas num comentário pessoal, por escrito, ou até numa simples recriação. Se me afasto do mundo (das pessoas e das coisas) quando leio, porque ler requer isolamento e silêncio, ganho depois um pouco mais de uma outra consciência acerca desse mundo, de mim e dos outros. É justamente por isto que ler é um acto insubstituível. Ninguém, em rigor, pode ler por nós. É como dar mergulhos num rio ou numa piscina: já alguma vez alguém aprendeu a nadar por correspondência? 

Martins, Francisco, in Ao encontro de Aparição – em torno de Vergílio Ferreira, Lisboa, Asa, 1999