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31 de dezembro de 2011

FELIZ ANO NOVO!


Pierna, de Ester García

   Um salto qualitativo em 2012!

Um salto de solidariedade,

de humanismo...

Até adormecer... um percurso pela literacia digital...

Ilustração de Mae Besom


Em cada ano que passa só a abertura à surpresa, ao inesperado, ao desconhecido abre o coração e a mente para receber o novo. Cada ano é um processo de aprendizagens.

Este blogue pretende ser pessoal, um portefólio de leituras que vou realizando, sugerindo, auspiciando. Insere-se num conceito alargado de literacia. A literacia digital é uma dessas vertentes, que aqui tem sido ensaiada, experimentada, com ferramentas como o Photostory, o Slideshare ou o Glogster Edu.

Esta última ferramenta permite inserir e apresentar imagens, sons, caixas de texto, tanto pré-definidos como editados, criados pelo utilizador, como a ilustração de Smergelis Laimonas Jono apresentada em série. Este é um dos muitos efeitos desta tecnologia, que acabei de explorar e aplicar aqui.

Gostaria de ter inscrito, no longo e vermelho cabelo do anjo, os votos de Feliz Ano Novo, mas a minha intuição informática não mo permitiu. Consegui, sim, editar o tamanho das imagens, para que assumissem um porte que não excedesse o do blogue (com a ajuda da videoconferência com a Drª Helena Felizardo no Cisco), o que já me deixou orgulhosa.

Que novas tecnologias a descobrir me revelará 2012? Estou curiosa... Saberei quando despertar no novo ano. Agora durmo.

30 de dezembro de 2011

Inéditos quase de Natal

A época de Natal não se resume a um dia, mas amplifica-se desde a sua preparação (Advento) até à Epifania, Dia de Reis.

Por isso, aqui fica mais uma história. Esta é de Hélia Correia, ao JL, nº 1075, de dezembro de 2011.

A ilustração é de Afonso Cruz, que também escreveu um conto, mas com um final menos natalício e deveras surpreendente...

Do meio para trás

Ilustração de Afonso Cruz

Havia um espelho perto da saída e ele olhou-o distraidamente. Avançou mas depois voltou atrás. Ia apressado mas a imagem de si mesmo, por razões pouco claras, atraiu-o. Tratava-se de um velho mas um velho sempre ele fora, não era uma surpresa. Cabelo e barba brancos, a figura avolumada na barriga, as rugas, misto de bonomia e desidratação. O casaco vermelho com os seus debruns de pele clara parecia iluminar de uma luz própria o rosto sorridente. O que o chamara, então? Os olhos tristes. Os olhos mergulhados numa sombra. A cara estava como dividida por uma linha reta horizontal. Na metade de baixo desenhava-se o movimento da satisfação, com os cantos dos lábios ascendendo. A metade de cima descaía com um inesperado abatimento.
(...)
Pegou no saco dos presentes, pô-lo ao ombro e alguma coisa lhe doeu. (...)

 
Hélia Correia, JL - Jornal de Letras, Artes e Ideias



29 de dezembro de 2011

Os textos, as histórias, a poesia aconchegam-nos no lazer e são bálsamo nos tempos de trabalho e de stress, de prazos a cumprir.

Esta é uma história de infância, uma narrativa que evoca um imaginário inocente, afável, dos primeiros textos lidos. Ainda assim...

Ilustração de Yihang Pan

Todos os anos, quando os velhos Reis Magos acabam de atravessar a pequena estrada de areia que se esboça entre caminhos de musgo e lagos feitos de bocados de espelho partido; quando a estrela de prata que se suspende entre os dois exemplares de “A Paleta e o Mundo” de Mário Dionísio se recolhe para regressar à velha caixa de papelão, com trinta anos de viagens, cheia de bocados de jornal amachucados que ainda guardam notícias de dias que já foram e onde se embrulham os cordeirinhos, os pastores, as oferendas várias que o Menino Jesus recebeu, apesar de já lhe faltar a mãozinha direita que alguém partiu em excesso de limpeza; todos os anos, dizia, recordo a história que o Fernando Midões me contou, certa tarde em que misturámos poemas com lágrimas.

27 de dezembro de 2011

Carlos C. Lainez, The sofa cat

A leitura é acto tipicamente humano (o animal não lê - mas ele também não veste, ainda que se associe gregariamente para buscar alimento ou para defesa). Tal acto deve ser assumido sobretudo como profundamente regenerador do homem (conferindo à sua interioridade a dimensão dos demais naquilo que eles de melhor podem oferecer); é fundamentalmente um acto intenso e assumi-lo como hábito consolidado levará a produzir integração social.

Aires A. Nascimento

26 de dezembro de 2011

Memória de infância


"O nome de um livro lido (conquistado?) já nada tem a ver com o que ele representava antes. O livro prepara-se para viver a sua própria vida na nossa memória."

BONNET, Bibliotecas cheias de fantasmas (2010:69)





Aqui fica a memória de uma história de infância, de Hans Christian Andersen, para os dias frios e mágicos de Natal.



Estava tanto frio! A neve não parava de cair e a noite aproximava-se. Aquela era a última noite de Dezembro, véspera do dia de Ano Novo. Perdida no meio do frio intenso e da escuridão, uma pobre rapariguinha seguia pela rua fora, com a cabeça descoberta e os pés descalços. É certo que ao sair de casa trazia um par de chinelos, mas não duraram muito tempo, porque eram uns chinelos que já tinham pertencido à mãe, e ficavam-lhe tão grandes, que a menina os perdeu quando teve de atravessar a rua a correr para fugir de um trem. Um dos chinelos desapareceu no meio da neve, e o outro foi apanhado por um garoto que o levou, pensando fazer dele um berço para a irmã mais nova brincar.
Por isso, a rapariguinha seguia com os pés descalços e já roxos de frio; levava no avental uma quantidade de fósforos, e estendia um maço deles a toda a gente que passava, apregoando: — Quem compra fósforos bons e baratos? — Mas o dia tinha-lhe corrido mal.

ANDERSEN, Hans Christian, A menina dos fósforos (adaptado)

24 de dezembro de 2011

Baby Princess, de Adolie Day


Ninguém o viu nascer.
Mas todos acreditam
Que nasceu.
É um menino e é Deus.

Miguel Torga

A alegria do Natal

Ilustração de Adolie Day

A alegria dilata, a tristeza aprisiona. Para se ser alegre é preciso um certo esquecimento de si, uma perda de si no maravilhamento. É por isso que a alegria do adulto é muitas vezes pouco natural, enquanto que a da criança é total.

Monge Cartuxo, in Vivre dans l'intimité du Christ

Deus é não poder

O homem é uma realidade religiosa. O problema é que essa referência possa aparecer como objeto, como se Deus fosse manipulador ou manipulável. Uma espécie de ser mágico de que todas as coisas dependem. Outra coisa é ser algo de que o homem se serve para dominar.  (...) O que o cristianismo trouxe foi que Deus não é poder. É o não-poder. Mas não foi assim que a coisa foi traduzida.

Eduardo Lourenço, Expresso, 23.12.2011 

23 de dezembro de 2011

Poema de Natal

Quando despontarem as primeiras luzes do Seu cortejo
Ilustração de Soledad Céspedes
ainda nos faltará tudo:
o azeite na almotolia,
um alfabeto que descreva com outra firmeza o azul,
formas indivisíveis para este amor,
que só em fragmentos
e numa gramática imprecisa
conseguimos viver.

Quando despontarem as primeiras luzes
estaremos talvez longe:

Ilustração de Arianna Floris

à altura dos olhos continuaremos a trazer a mesma indisfarçável solidão
as mesmas mediações ilegíveis através do tempo
as mesmas demoras tatuadas.
O Seu advento encontra-nos sempre impreparados
e, contudo, este é o momento em que
 por puro dom se nasce.

A Sua vinda testemunha o que não sabíamos ainda: a nossa frágil humanidade é narração
da autobiografia de Deus.
 José Tolentino Mendonça

Eterna procura


O artista testemunha, na experiência dos materiais, as formas da eterna procura.
                                       
        FRANCO, Joaquim et al., Um Menino chamado Natal

Aquele abraço!


Um doce abraço, de Bolos & Rebolos 

22 de dezembro de 2011

Inexprimível

Ilustração de Sam Hyuen Kim



As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou.

Rainer Maria Rilke

21 de dezembro de 2011

O trovão e o pirilampo

Ilustração de Rita Cardelli

A diferença entre a palavra certa e a palavra quase certa é a diferença entre um trovão e um pirilampo.

Mark Twain

Votos de muita magia neste Natal...


 

Um livro é a prova de que os homens são capazes de fazer magia.


Carl Sagan


Polina, artista russa

20 de dezembro de 2011

Palavras



Palavras - são tão inocentes e importantes enquanto dispostas num dicionário; mas tão potencialmente boas ou más elas se tornam nas mãos de quem sabe combiná-las!

Nathaniel Hawthorne,
escritor norte-americano, séc. XIX 

Eu nem sequer gosto de escrever

Ilustração de Mathiole - Matheus Lopes Castro
Eu nem sequer gosto de escrever. Acontece-me às vezes estar tão desesperado que me refugio no papel como quem se esconde para chorar. E o mais estranho é arrancar da minha angústia palavras de profunda reconciliação com a vida.

                               Eugénio de Andrade

17 de dezembro de 2011

Natal do agora e do eterno

Angel, de Shiori Matsumoto
O Presépio somos nós
É dentro de nós que Jesus nasce
Dentro destes gestos que em igual medida
a esperança e a sombra revestem
Dentro das nossas palavras e do seu tráfego sonâmbulo
Dentro do riso e da hesitação
Dentro do dom e da demora
Dentro do redemoinho e da prece
Dentro daquilo que não soubemos ou ainda não tentamos

O Presépio somos nós
É dentro de nós que Jesus nasce
Dentro de cada idade e estação
Dentro de cada encontro e de cada perda
Dentro do que cresce e do que se derruba
Dentro da pedra e do voo
Dentro do que em nós atravessa a água ou atravessa o fogo
Dentro da viagem e do caminho que sem saída parece

O Presépio somos nós
É dentro de nós que Jesus nasce
Dentro da alegria e da nudez do tempo
Dentro do calor da casa e do relento imprevisto
Dentro do declive e da planura
Dentro da lâmpada e do grito
Dentro da sede e da fonte
Dentro do agora e dentro do eterno

José Tolentino Mendonça
                                                                    

13 de dezembro de 2011


Audiolivro, capa


"...o problema das moscas é ao nível da erudição - disse o senhor Henri.

...as moscas não têm linguagem porque não têm biblioteca, e se tivessem biblioteca teriam erudição.

...a erudição é uma espécie de linguagem igual à nossa, só que não a percebemos.

...eu sou muito erudito, mas quando entro nesta biblioteca engarrafada deixo a erudição à porta e transformo-me num animal dos copos."

Gonçalo M. Tavares, in O Senhor Henri

12 de dezembro de 2011

O Mistério está todo na infância



E, por fim, Deus regressa
carregado de intimidade e de imprevisto
já olhado de cima pelos séculos
Ilustração de Victoria Kirdy
... humilde medida de um oral silêncio
que pensámos destinado a perder

Eis que Deus sobe a escada íngreme
mil vezes por nós repetida
e se detém à espera sem nenhuma impaciência
com a brandura de um cordeiro doente

Qual de nós dois é a sombra do outro?
Mesmo se piedade alguma conservar os mapas
desceremos quase a seguir
desmedidos e vazios
como o tronco de uma árvore

O mistério está todo na infância:
é preciso que o homem siga
o que há de mais luminoso
à maneira da criança futura

 Poema para Bento XVI de José Tolentino Mendonça, nomeado Consultor de Cultura no Vaticano

11 de dezembro de 2011

Tributo ao leitor

Corriendo entre libros -ilustração de Nuria Feijoo
...o verbo é ser o que
é, sem ter sido o que será, na definição
conjugada das pessoas que agem, sem
que o saibam, e das que sabem, sem agir.

Nuno Júdice, in A matéria do poema  

9 de dezembro de 2011

Pesca literária


A minha posição de leitora é a de adesão a As Pequenas Memórias, tal como o narrador se extasiou com um peixe de água doce que não chegou a pescar. Dedicou-lhe, porém, o silêncio, a espera, a contemplação que o tornaram único no mundo, como o principezinho para a raposa em Saint-Exupéry: “Não creio que exista no mundo um silêncio mais profundo que o silêncio da água. Senti-o naquela hora e nunca mais o esqueci. (…) De uma maneira ou de outra, porém, com o meu anzol enganchado nas guelras, [o peixe] tinha a minha marca, era meu” (p. 86).

Mulher ou peixe
 Ilustração de Jaroslav Betehtin
Também o livro As Pequenas Memórias passou a fazer parte da minha vida de leitora. É meu. Ao contrário de “aquele barbo” do narrador, pesquei-o!

Uma questão de literatura

Aprecie-se ou não José Saramago, o autor/escritor/homem, ou alguma temática ou estilo das suas obras, certo é que estamos perante páginas de literatura em As Pequenas Memórias.
La noche pasa… la lectura queda
(ilustração de Violetno)

A propriedade lexical, que consiste em nomear cada objeto ou realidade com um vocábulo preciso, compagina-se com a novidade e liberdade semânticas que o levam a associar com criatividade uma realidade já existente a outra que lhe ocorre, adaptando, por exemplo, expressões idiomáticas em “Também inutilmente se chorará o azeite derramado” (numa associação fonética de “leite” com “azeite”, remetendo para o contexto descrito dos “velhos olivais” (p.15) ou em “a minha memória de infante” (p.33), num processo de paronímia com “memória de elefante”, criando assim, pelo trocadilho, uma antítese, pois a sua memória de criança não lhe permitia alcançar ainda a prodigiosa recordação do tempo em que teriam começado as desavenças familiares.

A maestria estilística manifesta-se tão simplesmente na tripla adjetivação que revela como num balão (“aquele era nada mais nada menos que o meu primeiro balão em todos os seis ou sete anos que levava de vida”) pode caber o universo onírico, fantástico de uma criança, ainda que gorado quando se esvazia (“Aquela coisa suja, enrugada e informe era realmente o mundo” (p.77)) ou ainda no tom coloquial que mantém com o leitor, aproximando-o das suas vivências ou retificando as suas memórias, precisando factos ou a sua sucessão: “Como acaba de se ver, não andava equivocado quando escrevi que havíamos vivido duas vezes na Rua Carrilho Videira, mas já foi o engano gravíssimo quando (…) acrescentei que estava na idade de onze anos quando do episódio com a Domitília. Nada disso. Na verdade, eu não teria mais que seis, e ela andaria pelos oito” (p.119).

Esta familiaridade com o leitor cria, de facto, por momentos, a sensação de que o narrador (ou mesmo o autor?) se nos dirige, como se nos respeitasse a ponto de retificar a informação biográfica que vai tecendo entre as páginas. Mas não será a verosimilhança tão somente mais um traço da magnitude literária da narrativa? Pouco importa que o autor de Todos os Nomes tenha tido estas ou aquelas (inúmeras) aventuras amorosas. O certo é que nos deixa presos à escrita quais bacorinhos na cama dos avós. 

Mª Carla Crespo

7 de dezembro de 2011

Desvanecimentos partilhados

Como diz o psicanalista e professor de literatura francesa Pierre Bayard, "a leitura é lugar de desvanecimento".

Ilustração de Noma Bliss e Jim Bliss
Os desvanecimentos partilhados tornam-se ainda mais consistentes. Obrigada, colegas.